20/08/2025

STF analisará ICMS em marketplaces; advogado alerta para impactos

Fonte: Migalhas quentes
Na última semana, o STF reconheceu repercussão geral em recurso que discute
a validade de lei do Estado do Rio de Janeiro que atribui a marketplaces e
intermediadores de pagamento a responsabilidade pelo recolhimento do ICMS
em operações com mercadorias não digitais, nos casos de ausência de nota fiscal
ou descumprimento de obrigações acessórias.
Para Ricardo Cosentino, sócio da área de Tributário da banca Mattos Filho,
a eventual declaração de constitucionalidade da lei ampliaria a responsabilidade
das plataformas, gerando aumento de custos de compliance e repasse financeiro
aos vendedores.
O tributarista aponta três efeitos imediatos da decisão:
1. Ampliação das responsabilidade tributária, com a absorção da
responsabilidade pelas obrigações não cumpridas pelos vendedores;
2. Aumento dos custos com compliance, uma vez que essas plataformas
devem implementar (ou reforçar) sistemas de monitoramento dos
vendedores/parceiros para a verificação do cumprimento das obrigações
tributárias, assumindo função fiscalizatória que naturalmente deveria ser
do Estado; e
3. Repercussão financeira direta, uma vez que essas plataformas se verão
obrigadas a aumentar comissões e taxas para cobrir a assunção desse
passivo tributário.
Prejuízo aos pequenos
Ainda, os pequenos empreendedores seriam os mais impactados pela medida,
já que o recolhimento do tributo ensejaria o aumento de custos para uso das
plataformas e ferramentas "uma vez que os custos decorrentes das ferramentas de
compliance e da assunção do passivo tributário deverá, ainda que em parte, ser transferido
para os vendedores/parceiros mediante o aumento de comissões e taxas (ou até pela retenção
dos valores a serem recebidos até a comprovação da regularidade tributária)".
Outro efeito para esse núcleo de empreendedores seria o bloqueio ou a exclusão
do mercado digital.
Efeito cascata
Ricardo Consentino também avalia que a validação da lei, pelo STF, pode
abrir espaço para que outros Estados editem leis com hipóteses semelhantes e
conferirá legitimidade ao modelo de responsabilização solidárias dos
marketplaces e intermediadores de pagamento.
"Neste contexto, os estados que já possuem legislação semelhante (ex. Ceará, Bahia, Mato
Grosso, Paraíba) enxergariam o seu modelo como constitucionalmente validado. Por outro
lado, a validação desse modelo aumenta uma pressão para que os Estados que ainda não
aprovaram leis (ex. Alagoas, Rio Grande do Norte e Santa Cataria) para prever a
responsabilização dos marketplaces e intermediadores de pagamento."
Cosentino ressalta, contudo, que a ausência de uma legislação complementar
nacional disciplinando a matéria gera risco de assimetria regulatória.
"Na falta de parâmetros uniformes, cada Estado ficaria livre para editar leis com critérios
próprios, o que amplia a insegurança jurídica. A expectativa é de que a Reforma Tributária,
por meio da futura LC 214/25, estabeleça diretrizes nacionais claras sobre a
responsabilidade dos marketplaces e intermediadores de pagamento", conclui.
Entenda
O caso envolve a lei 8.795/20, do Rio de Janeiro, que alterou a lei 2.657/96 para
prever novas hipóteses de sujeição passiva tributária.
O recurso extraordinário foi interposto contra acórdão do TJ/RJ em ação direta
de inconstitucionalidade. O tribunal fluminense declarou inconstitucionais
dispositivos da lei no que se referiam à tributação de bens e mercadorias digitais
(seguindo precedentes do STF sobre serviços de streaming), mas manteve a
possibilidade de responsabilizar plataformas e intermediadores no comércio de
bens não digitais.
O recorrente alega violação aos arts. 146, III, b, e 155, II e § 2º, XII, da CF,
sustentando que apenas lei complementar Federal poderia criar hipóteses de
responsabilidade tributária.
A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro defendeu a norma, afirmando que
as hipóteses criadas estariam em harmonia com as regras gerais do CTN e que
plataformas e instituições financeiras teriam vínculo com o fato gerador do
ICMS.
Repercussão geral
O relator, ministro Luiz Fux, ressaltou que o tema possui natureza
constitucional, pois envolve a reserva de lei complementar para definir regras
de responsabilidade tributária no âmbito do ICMS.
Citou precedentes como o RE 562.276 (Tema 13), que declarou
inconstitucional a criação de hipóteses de responsabilidade por lei ordinária
Federal, e a ADIn 6.284, que afastou norma estadual sobre responsabilidade de
terceiros em conflito com o CTN.
Fux destacou ainda a relevância econômica e social do debate, diante da
expansão do comércio eletrônico e da importância das plataformas digitais para
pequenos empreendedores e para a concorrência leal, bem como o impacto
potencial da decisão sobre legislações semelhantes em outros Estados, como
Ceará, Bahia, Mato Grosso, Paraíba e São Paulo.
· Processo: RE 1.554.371